25 maio 2008

Confissões de um ex-Tucano


Abaixo uma entrevista com um ex tucano, preservando o email do mesmo, mas não omitindo seu nome.


O PESO DO BICO
Raul Longo

Antonio Carlos Mendonça é um amigo e correspondente tucano. Ou melhor, como ele mesmo se auto-definiu, ex-tucano.
Remanescente dos movimentos estudantis dos anos 60, acreditou nas propostas do PSDB e durante 2005 e 2006 era um de meus debatedores sobre o escândalo do mensalão.
Compilei algumas de nossas mais recentes conversas desde que, demonstrando sua dignidade e caráter, escreveu confessando-me suas decepções com o partido do qual era eleitor e defensor.
Transformei as respostas a algumas questões que levantei sobre sua decisão em não mais votar para candidatos daquele partido, em forma de uma única entrevista.
Submeti à sua apreciação, pedindo autorização para divulgá-la. Sem nenhuma intencionalidade abreviará-lhe o nome em sigla que o deixou irritado, denunciando uma das razões de sua decisão.
Atendi ao pedido de evitar a sigla nefasta, e mantive o restante conforme seu assentimento.

Você considera que o PSDB degenerou?

AC: - A expressão é um pouco pesada... Mas talvez seja mesmo a mais indicada. De toda forma não há como negar que o PSDB de hoje é outro partido. Não corresponde mais aos ideais daqueles que o fundaram.

Quais foram esses ideais?

AC: - Basicamente não muito diferentes dos do PT. Ou pelo menos dos fundadores do PT.

Então você entende que o PT também sofreu uma degeneração, como ocorreu com o PSDB?

AC: - Não sei... Me pareceu que sim por ocasião do escândalo do mensalão. Mas o PT ou o governo reagiram devidamente, e hoje se pode observar aquele escândalo sobre outra ótica.

Como você o observa hoje?

AC: - Casos similares aconteceram no governo PSDB: a compra de votos pela emenda da reeleição, o envolvimento do genro de FHC numa falência fraudulenta, o caso Marka-Cindam. No entanto não se tornaram escândalo.

O que há de similar a esses casos que você relaciona, no governo Lula?

AC: - Você tem razão... Talvez esses acontecimentos sejam muito piores, mais negativos à nação, do que o esquema denunciado por Roberto Jefferson. Mas o que quero dizer é que não se tornaram escândalo, a mídia não se mobilizou para denunciá-los.

A mídia também não denunciou, ou não deu igual divulgação para o mesmo esquema do mensalão, através dos mesmos agentes e instituições financeiras, em benefício do ex-presidente do PSDB. Aí sim, até as importâncias eram similares, mas destinadas à um único estado.

AC: - Pois é... Essas informações que hoje temos, inclusive de que o PSDB, ao contrário do PT, não honrou com a dívida contraída através do Marcos Valério, é que muda minha ótica sobre o escândalo do mensalão.
Eu não era petista (e continuo não sendo), mesmo assim na ocasião fiquei profundamente chocado com o PT. Mas hoje percebo que a utilização do mesmo esquema pelo PSDB foi muito mais decepcionante.

Porque mais decepcionante, se os esquemas eram iguais?

AC: - Eram iguais e naturais. Em ambos os casos haviam dívidas que tinham de ser cobertas. A legislação eleitoral brasileira é que é mal formulada, e a saída para PT e PSDB foram esses empréstimos. Acontece que o PT vinha honrando o empréstimo contraído, e o PSDB não, apesar do tanto tempo que ocupara o poder não só do país, como dos estados mais ricos da federação. Além disso, impossível negar que o PSDB, tendo o apoio do empresariado, da FIESP, da FEBRABAN, é um partido muito mais rico do que o PT, que nunca foi apoiado pelos grandes capitais.

Você está dizendo que o PT é mais honesto que o PSDB?

AC: - Não exatamente isso... Mas hoje o PSDB me parece ter se tornado muito desonesto. Entendo que em todos os partidos há gente honesta e desonesta, e não estou dizendo isso para desculpar PT e PSDB pelo Caixa 2. Como disse, acho que o Caixa 2 de ambos foi uma saída para uma contingência criada pela legislação eleitoral, então não culpo nem um nem outro por terem empregado este recurso. Mesmo reconhecendo que ao PSDB esse recurso era menos necessário do que ao PT, em início de governo, não culpo o PSDB por o ter feito. Mas a descoberta de que o PSDB o fez, é que me fez compreender a injustiça do escândalo armado contra o PT. E isso é de que culpo o PSDB.

Você considera que faltou ética política ao PSDB?

AC: - Olha, eu não acredito em ética na política. Me parece natural que o PSDB explorasse o escândalo em seu benefício, mesmo considerando uma hipocrisia acusar a outro de um ato que eles mesmos cometeram. Mas o que me assusta, hoje, é que o PSDB deixou de ser um partido de propostas políticas, para se resumir a promotor de escândalos. Hoje não vejo grande diferença entre o PSDB e o PRONA. O PRONA, para angariar votos, dependia de um personagem grotesco: o Enéas. Vazio e grotesco. O PSDB entrou no mesmo caminho: um partido vazio que para angariar votos precisa criar escândalos grotescos.

Você disse que em todos os partidos há gente honesta e desonesta. Não lhe parece possível que os honestos do PSDB ainda possam recuperar o partido?

AC: - Talvez! Me parece que sim, e gostaria muito que isso acontecesse, mas na medida que um Secretário do Trabalho do governo de São Paulo, o Guilherme Afif Domingos, sai afirmando que todo brasileiro não nascido naquele estado é vagabundo, fica difícil manter alguma esperança.
Aí vem um deputado do PSDB especular sobre a queda de um avião que não caiu. Para apoiar o PSDB tem uma imprensa que cria uma epidemia de febre amarela que não existe. Uma imprensa que não noticia nada sobre conclusões investigativas de escândalos que ela própria divulgou. Você mesmo me enviou a notícia, escondida, da comprovação de que os tais dólares na cueca não tinham nada a ver com o irmão do Genoíno ou com o PT. E os dólares de Cuba? Ora! Essa imprensa se desmoraliza e desmoraliza a quem ela apóia e defende. Enobrece quem ela ataca. Hoje o PT até pode cometer o erro que for, e será inocentado pela própria acusação da imprensa. Acusação dessa imprensa que está aí, é elogio. E quem por ela é elogiado, pelo elogio já apresenta forte indício de ser desonesto, mau caráter.

E onde, na sua opinião, o PT ou o governo erram.

AC: - Eu não sei onde o PT erra. Certamente errará em alguma coisa. Todos erram. Mas erro maior do que o ridículo do Tasso Jereissati de se lamentar pelo governo Lula não citar os feitos do governo FHC, não existe.
Falou-se muito da fenomenal besteira do Agripino Maia em transformar a ministra em heroína, mártir. Mas o Agripino é do DEM e dali não se pode esperar nada muito inteligente mesmo. Mas a burrice do cho-ro-rô do Tasso foi muito pior! O que é aquilo? Depois de toda a armação de 2005/006 (e hoje é assim que percebo o escândalo do mensalão: pura armação) cometer o ridículo de fazer biquinho porque o governo Lula não anuncia que o Bolsa Família é um Bolsa Escola melhorado, ou o Luz Para Todos um Luz no Campo mais eficiente, foi o que me fez enxergar de uma vez por todas que o PSDB não tem qualquer futuro como partido político.

Na sua opinião, o que provocou essa degeneração no PSDB?

AC: - A questão da reeleição. Ainda hoje estou convencido de que na primeira eleição de FHC, o PSDB era muito mais indicado para governar o país do que o PT. Apesar de o governo Lula ter se provado muito competente, na época não tinha melhor qualificação do que o PSDB. Mas o poder subiu à cabeça e inventaram a tese da reeleição. Para garanti-la FHC errou na manutenção do arrocho cambial e, pior que isso, reforçou alianças com tudo aquilo que sempre representou nossos inimigos: os políticos da ditadura locados no PFL e a imprensa da ditadura. A partir daí o PSDB se confundiu com o inimigo. Os tucanos cresceram o bico e não podendo mais com ele estão virando urubus.

Quais partidos ou personalidades políticas, hoje, mereceriam seu voto?

AC: - Se Lula saísse candidato hoje, votaria nele. Se Dilma Roussef for candidata, votarei nela. Mas não pelo PT, e sim pela competência que essas personalidades denotam. Há outras pessoas competentes no PT, mas não é a maioria do partido, pelo contrário.
No PSDB também tem gente competente, mas o partido está de tal forma agrilhoado a alianças espúrias aos seus ideais iniciais que nem nos competentes do PSDB dá para se acreditar. Como se pode confiar em alguém de um partido que mantém em seu quadro um Álvaro Dias, evidente corrupto ativo que negocia através de assessores dados sigilosos, monta um dossiê para divulgação na imprensa e tem a cara de pau de dizer que o dossiê foi montado pela Casa Civil e chegou em suas mãos por mero acaso? É muita cara de pau!
Isso é o que se tornou o PSDB: uma associação para produção e promoção de escândalos, através da mídia criminosa e apoiado pelos políticos da tortura e da repressão. E não têm o menor pudor em fazer o eleitor e o povo brasileiro de palhaços.
Mas não é por eu ter perdido um partido, não será por terem me roubado o partido no qual acreditava, que adotarei qualquer outro. Como partido, hoje não acredito em nenhum. Tenho esperanças em alguns nomes. Além do Lula e da Dilma, tem o Ciro Gomes e o Requião.

E o José Serra, o Alckmin, o Aécio?

AC: - Essa não vou nem responder.

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