22 novembro 2005

A LUTA DE DIRCEU

José Dirceu enfrenta mais uma batalha em cenário cada vez menos hostil
Comissão vota parecer sobre novo recurso do ex-ministro da Casa Civil, que enfrenta processo de cassação no Congresso. Não faltam manobras para atingi-lo, mas o deputado federal José Dirceu (PT-SP) se mostra cada vez menos vulnerável.
Luiz Augusto Gollo - Carta Maior 22/11/2005

Brasília - Mais um capítulo da novela da cassação do mandato do deputado José Dirceu (PT-SP) vai ao ar, nesta terça-feira (22), com a votação de mais um recurso do ex-ministro da Casa Civil na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Federal. Dessa vez, o petista solicita que as testemunhas sejam ouvidas novamente, agora na ordem regimental, ou seja, primeiro as da acusação e depois as da defesa. Como no seu processo verificou-se a inversão, os advogados apontam prejuízo ao direito de defesa.

O parecer do relator Sérgio Miranda (PDT-MG) está na CCJ desde a quarta-feira passada e poderá ser aprovado com alguma dificuldade por duas razões: não atende na totalidade a pretensão de Dirceu e estabelece um limite para recursos em ações futuras no Conselho de Ética, assegurando um limite para o encerramento da novela: o réu terá direito a um recurso no prazo de cinco sessões, sem prejuízo da tramitação do processo. O conselho próprio já prorrogou a tramitação do caso de Dirceu por 45 dias, estipulado pelo Código de Ética da Casa em 90 dias. “Uma regra aprovada no código pela maioria dos 513 deputados foi revogada por uma decisão inferior em contrário, tomada pelos 15 membros do Conselho de Ética”, ressalta a defesa.

Ainda que o relatório de Miranda seja aprovado na CCJ, o último capítulo dessa história, ao que tudo indica, ainda não está tão próximo assim. São esperados pelo menos três votos em separado, dos deputados Roberto Magalhães (PFL-PE), Inaldo Leitão (PL-PB) e Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP) – o primeiro deles contrário e os dois subseqüentes favoráveis ao deputado José Dirceu.

Existe ainda um outro detalhe importante relacionado ao processo em curso - a do prazo regimental mínimo de duas sessões para entre o término da tramitação nas comissões e a votação no Plenário da Câmara. Trata-se de detalhe importante, pois a defesa poderá ganhar dois dias úteis, a quarta e a quinta-feiras (23 e 24), empurrando para a próxima semana a decisão final sobre o ex-ministro, já que as sessões deliberativas tradicionalmente não costumam ser marcadas na segunda nem na sexta-feira.

Alguns colegas de Dirceu no Parlamento, porém, se desdobram para minar a resistência do ex-guerrilheiro. Autor do parecer pela cassação de Dirceu no Conselho de Ética, Júlio Delgado (PSB-MG) está de volta à cena para recolher assinaturas de deputados pela “quebra de interstício”, ou seja, pela pronta votação no plenário. Tal prerrogativa foi lançada no caso do deputado Sandro Mabel (PL-GO), absolvido há duas semanas por 340 deputados, contra 108, 17 nulos e duas abstenções. A diferença é que havia a clara intenção da maioria dos deputados e deputadas de evitar cassação de Mabel, enquanto o ânimo com relação ao ex-chefe da Casa Civil é bem diferente. Pesa em desfavor à manobra de Delgado, contudo, o receio de nova apelação ao Supremo Tribunal Federal (STF) por parte da defesa de Dirceu, o que poderia gerar mais desgaste para o Poder Legislativo, diante do Poder Judiciário.

Entre perdas e ganhos, José Dirceu ganhou a seu favor mais um argumento de peso: o relatório final do deputado Ibrahim Abi-Ackel (PP-MG), da CPI da Compra de Votos. Na peça, Abi-Ackel chegou à seguinte conclusão a respeito do esquema denunciado por Jefferson. “Foi possível relacionar os nomes de parlamentares que perceberam vantagens ilícitas, em virtude da ausência de provas concretas que permitam a atribuição de responsabilidade penal a deputados. Mas são múltiplos os indícios de que houve distribuição de dinheiro a deputados da base parlamentar do governo. O recebimento desse dinheiro não caracteriza o ‘mensalão’. Mas houve, sem dúvida, pagamentos de dinheiro em espécie, em alguns casos em prestação única e outros em prestações sucessivas. A não citação de nomes se deve ao fato de não ter havido confissões pessoais ou de terceiros, nem flagrante”.

Em outra CPI, porém, Dirceu deve enfrentar mais percalços. O deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), relator na CPI dos Correios, deve pedir o indiciamento de nada menos que 50 pessoas, entre as quais o mesmo José Dirceu. A citação de Dirceu contraria novamente o Regimento Interno, já que o ex-ministro está em julgamento no Conselho de Ética desde muito antes de ter o nome citado na CPI.

Pesquisas realizadas até bem pouco tempo atrás entre deputados dispostos a revelar sua intenção de voto davam como certa a cassação de Dirceu por dois terços dos votos – margem bem mais ampla do que a do ex-deputado Roberto Jefferson, que era réu confesso e admitiu ter recebido R$ 4 milhões de Marcos Valério. O quadro, definitivamente, já não é mais o mesmo. Seja como for e demore o quanto demorar, o processo contra Dirceu vem se constituindo como uma verdadeira aula de resistência com base em recursos legais. A cada dia que passa, as chances de José Dirceu crescem, na exata medida que se sucedem atos públicos em defesa do seu mandato, como o do último fim de semana na Assembléia Legislativa de São Paulo e o da noite desta terça na sede da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI), em Brasília, além das manifestações de intelectuais e artistas.

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