10 outubro 2008

Porque Governante Progressista nomeia filhote da ditadura

Porque Governante Progressista nomeia filhote da ditadura


Leio inúmeras mensagens de decepção e frustração no e-group dos amigos que lutaram contra o arbítrio aqui no Paraná, indignados com o fato de ver o presidente, governadores e prefeitos progressistas nomearem em suas equipes pessoas que serviram a ditadura. Pessoas que eram da Arena, PDS, lambe-botas e muitos que eram até dedos-duros que conhecemos. Em razão disso, possuído por um profundo sentimento de generosidade e de compreensão humana, resolvi mostrar a causa principal deste fato acontecer. Na verdade isto é a realização de um projeto dos estrategistas do regime de exceção. Ora vejam porque.

O governo federal acaba de encaminhar uma proposta de reforma política ao Congresso Nacional propondo lista fechada, financiamento público exclusivo, fidelidade partidária, inelegibilidade, fim das coligações proporcionais e cláusula de barreira. Tal proposta partiu do diagnóstico do atual sistema que rege o processo político brasileiro, é “balizado por um presidencialismo de coalizão incrustado em um quadro partidário multifragmentado e volátil, que condiciona os governos à montagem de composições partidárias amplas, com vistas à garantia mínima de governabilidade”. E que num quadro desses, os sucessivos mandatários, desde o fim da ditadura de 64, tiveram dificuldades para governar, pois a montagem do governo e de sua sustentação no parlamento nunca se deu em bases programáticas. Pelo contrário. As coligações são apenas para atender às demandas do pleito, há exacerbação de personalismo, prevalência do poder econômico e fragilização dos partidos. Com reflexos nos demais poderes e nas esferas estadual e municipal.

Afinal, o sistema mantido pela nossa Constituição Federal foi o estruturado na ditadura, que vendo o seu modelo de desenvolvimento elitista e para poucos ruir com desemprego, carestia e miséria. Trouxe o avanço das oposições nos Estados mais populosos, com a inevitável perda da presidência, os governos e prefeituras, resolveram montar um sistema parlamentar para a elite econômico, a quem representava, continuar dando as cartas. Principalmente porque este sistema político elege inevitavelmente gente muito, muitíssima desqualificada. O que é bom para o poder econômico e para as oligarquias regionais continuarem mandando nos governos.

Diagnóstico correto colocado na mensagem da proposta de reforma política, porém, não se fala num dos temas mais importantes para a reforma política, que é a distorção do sistema representativo pela falta da adoção do coeficiente eleitoral nacional, para a eleição dos deputados federais e a necessidade de tirar o papel do Senado Federal de segunda Câmara revisora, que agride o Estado de direito democrático.

No caso da Câmara dos Deputados, casa de representação do povo, determinou que poderão eleger-se um mínimo de oito e um máximo de setenta deputados federais por Estado-membro. Não adotando a forma de coeficiente eleitoral nacional o que acabou produzindo uma distorção, pois aproximadamente 40% dos eleitores elegem 263 deputados federais e 60% dos eleitores elegem apenas 250 deputados federais.

O Senado Federal - casa de representação dos Estados-membros - que foi ampliado com a transformação de territórios pouco populosos e com pequenas economias, que deveria ter como atribuição discutir matérias de interesse da União e de conflitos entre as unidades federativas, mantendo o equilíbrio para o desenvolvimento das regiões. Mas, por distorção do sistema representativo, os senadores têm um dos campos de atribuições e competências dos mais amplos do mundo, podendo votar e vetar tudo, como se fosse uma segunda Câmara revisora.

A forma de impor um mínimo de três senadores por Estado-membro, gera uma distorção em que, aproximadamente, 40% dos eleitores elegem 59 senadores e 60% dos eleitores elegem apenas 22. Simbolizado na figura do senador eleito com 10 milhões de votos, tendo o mesmo peso de um senador que se elegeu com 300 mil votos. Isso é tão grave, pois o campo de atribuição e competência tão amplo acaba barrando a modernização das legislações brasileiras, pois representantes de Estados-membros poucos populosos e com economia pequena acabam impondo projetos locais, às vezes pessoais, em detrimento aos interesses estratégicos da sociedade brasileira.

Diante desse dilema, a reforma política - que seria realmente necessária - vai sendo protelada e o eleitor brasileiro em alguns Estados-membros vale 0,5 voto, enquanto em outros vale 15,4 votos. Não é por acaso o desinteresse pelas eleições, pois a distorção do sistema representativo distancia o representante do representado, comprometendo o sistema democrático. Distanciamento que não será resolvido só com a reforma proposta.

Em função dessa distorção, qualquer Presidente da República, Governador e Prefeito eleito pelo voto direto, por mais progressista que seja, teve, tem e terá problema de governabilidade. Resultando naquilo que a ditadura queria um presidencialismo de coalização, ou seja, você pensa que esta votando num presidente, governador e prefeito com um programa de governo progressista, mas nas eleições do parlamento, em razão da deformação do sistema político, a sociedade não percebe que elege um governo de coalização, às vezes conservador, desqualificado e retrógrado. E por isso, é difícil governar e implantar políticas públicas voltadas para o povo por culpa desta engenharia política deixada pela ditadura e que o poder econômico e as oligarquias regionais resistem em mudar. Pois ganharam e ganham muito com ela.

Há de se considerar também que a distorção do sistema representativo, estruturado no período de arbítrio, para evitar o avanço das oposições progressistas, acabou gerando um custo muito alto para o país manter a governabilidade, pois para garantir a maioria no parlamento, foi usado como moeda de troca à criação e a manutenção de inúmeras estruturas públicas desnecessárias no âmbito federal, estadual e municipal. Incluindo as indicações para o poder judiciário e nos tribunais de contas, colocando em dúvida o princípio da independência dos poderes. Além do mais, acabamos por ter um sistema representativo deformado que ajudou muito na construção de uma divida interna e externa e um sistema previdenciário que beneficiou poucos. E, por conseqüência, a manutenção de um sistema tributário questionável e uma política de juros que onera o setor produtivo nacional e a sociedade, que são forçados a pagar a conta desta distorção.

Por isso, temos que continuar mobilizando a sociedade brasileira para debater a reforma política em profundidade sob a ótica de um novo pacto federativo, para que se redefinam as atribuições dos senadores, o critério de composição do Senado Federal e inclua a mudança na eleição da Câmara dos Deputados. Não só sob o enfoque da reforma do sistema partidário e eleitoral. Devendo-se exigir a implantação do coeficiente eleitoral nacional, de acordo com o fundamento do princípio "um cidadão, um voto". Esse princípio desaguará na reforma do Estado com o objetivo de se construir, verdadeiramente, um Estado de direito democrático e, por decorrência, um novo modelo de desenvolvimento democrático para todos os brasileiros.

Geraldo Serathiuk, advogado especializado em direito tributário pelo IBEJ/PR e estudante de MBA de Marketing e Estratégia da UFPR.

Nenhum comentário: