15 agosto 2008

Mendes, presidente do STF, advoga o Estado-tucano

Mendes, presidente do STF, advoga o Estado-tucano


Em palestra numa universidade de São Paulo, na segunda-feira, dia 11, o presidente do STF, Gilmar Mendes, afirmou que “o Estado constitucional é, por definição, um Estado contra-majoritário”. Ou seja, o Estado constitucional “por definição” tem que ir contra a maioria da população que o sustenta – e que, entre outras coisas, paga o salário do presidente do Supremo. Em seguida, Mendes emendou uma arenga contra os que querem introduzir as “classes sociais” no Estado e, especialmente, na Justiça.

A Constituição – cuja guarda legal cabe à instituição presidida por Mendes – começa pelas definições de que o Brasil é um “Estado Democrático de Direito” (art. 1º, caput), de que “todo o poder emana do povo” (art. 1º, parágrafo único) e de que a função do Estado é “promover o bem de todos” (art. 3º, inciso IV). Portanto, o nosso é, legalmente, um Estado majoritário – por isso, inclusive, é governado por quem a maioria escolher nas eleições.

Logo, é forçoso concluir que Mendes é contra o caráter do nosso Estado constitucional - e contra a própria Constituição. Difícil (na verdade, nem tanto) é saber o que ele está fazendo na presidência do tribunal que tem a missão de zelar pela Constituição.

Um “Estado contra-majoritário” pode ser um Estado fascista, um Estado ditatorial, um Estado oligárquico - ou um Estado tucano. Pode ser, em resumo, qualquer Estado em que, quando há uma constituição, ela é um penduricalho sem grande importância. Um “Estado contra-majoritário” pode ser tudo, menos um verdadeiro Estado “constitucional”, ou seja, um Estado democrático – pois só neste é que a Constituição tem importância.

Já se sabia que Mendes não era muito versado em questões judiciais. Agora, sabemos que ele, presidente da corte constitucional do país, ignora o que seja um Estado constitucional. Mais precisamente, ele é contra. O que não sabemos é se a teoria que expôs é de lavra própria, se ele a copiou do grande jurista lusitano Antônio de Oliveira Salazar, ou se ele a aprendeu em outro lugar, talvez na Alemanha, onde passou alguns anos, e onde esse tipo de teoria – e de Estado - esteve muito em voga.

Mas, deixemos a teoria em paz. A única razão porque Mendes a preconizou agora é a condenação geral ao seu desempenho, soltando um escroque preso de PF – o notório Daniel Dantas, por coincidência muito ligado ao círculo de Fernando Henrique, de quem Mendes foi Advogado-geral e que o nomeou para o STF, passando por cima de dezenas de competentes juristas.

Ruy Barbosa afirmou que o mais repugnante sistema moral é aquele em que “quem pouco furta é ladrão, quem muito furta, barão”. Por isso, odiava os juízes que se dobravam às injunções políticas para deixar à solta ladrões de alto coturno, enquanto condenavam inocentes e pequenos ladrões. Em “O Justo e a Justiça Política”, depois de compará-los a Pilatos, vituperou: “não há salvação para o juiz covarde”.

É possível que Mendes não tenha lido este jurista, que era baiano e escrevia em português. O fato é que para justificar seu ato de soltar um dos maiores escroques que o país já teve de suportar, transformou o Estado constitucional numa cafua – pois um “Estado contra-majoritário”, reduzido à sua expressão mais simples e essencial, é uma cafua no poder.

Em suma, não foi para livrar Dantas que Mendes concedeu dois habeas corpus a seu favor em 24 horas, mas porque sua função era ir contra a maioria – quase a unanimidade - do povo. Infelizmente, não vai colar. E, se colasse, seria pior ainda, pois a Justiça não existe para ser injusta, para ir contra o povo - e sim para livrá-lo dos que atentam contra ele. Exceto, naturalmente, nos Estados ditatoriais – ou tucanos.

Quanto às classes sociais, é evidente que Mendes quer passar que trata qualquer ladrão de galinhas como se fosse um Daniel Dantas. Mas isso é apenas a confissão de que privilegiou Dantas. Desde quando um elemento que roubou um país inteiro pode ser comparado a quem furtou alguns galináceos? Se ele tratasse por igual os dois casos, Dantas seria altamente – e injustamente – beneficiado. Mas, obviamente, isso também não é verdade: com quantos habeas corpus, do tipo que concedeu a Dantas, os ladrões de galinha foram contemplados por ele? Quantos dos últimos, integrantes de classes sociais desfavorecidas, conseguiram recorrer ao STF? A negação das classes na questão do Estado e da Justiça é, sempre e tão somente, farisaísmo.

Fonte: Hora do Povo


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