30 agosto 2006

A melancolia do jornalismo que se julgava dono do povo

por Adalberto Monteiro

O favoritismo do presidente Lula provocou uma onda de melancolia nos jornalistas que se julgavam tutores da consciência do povo. Pelas colunas dos duques e marquesas dos jornalões escorre um misto de ira, espanto e tristeza. Essa lamúria deste tipo de jornalismo é um sinal bom. ''Os de baixo''se movimentam na direção oposta ao que lhes ordena a mídia ''dos de cima''.

Ante as sucessivas pesquisas de intenção de voto que atestam a possibilidade de vitória de Lula já no primeiro turno, vê-se a arrogância dos colunistas dos jornalões ser substituída pela lamúria. Eles se julgavam donos da opinião pública, tutores da consciência do povo e, agora, ante o favoritismo da reeleição de Lula, derramam lágrimas pelas suas colunas. Lastimam a ineficiência da campanha sistemática que empreenderam contra o presidente da República.

Uns, numa melancolia de dar pena constatam que a mídia não é mais o quarto poder. Com uma franqueza não costumeira dizem que se o povo levasse a sério o que dizem os meios de comunicação, ''Lula estaria debatendo com os tribunais, não com os eleitores''. Outros, falando como se os jornalistas fossem juízes do Supremo Tribunal da Razão proclamam sentenças contra o povo: ''Mas se o veredicto for esse, dispensando o segundo turno, a afoiteza do eleitor terá prejudicado a qualidade democrática desta eleição''. (Quando FHC foi eleito duas vezes, no primeiro turno, o senhor Otávio Frias Filho, não reclamou ''da afoiteza do eleitor.'')

A verdade é que a maioria dos jornalistas da grande mídia, sobretudo, os articulistas, no auge da campanha que visava linchar o presidente da República, não escrevia análises, proclamava sentenças. As redações se viram infestadas dessas estranhas criaturas: jornalistas ''togados''. Senhores e senhoras, proprietárias da verdade e da razão. Quase com poder de polícia.



Ocorre que os meses se passaram, estamos praticamente a 30 dias das eleições, e o povo vem rasgando cada uma dessas sentenças. E esses jornalistas ''togados'' se vêem despidos de sua autoridade. Atônitos dão explicações desencontradas para o estranho fenômeno. Indagam: ''Como a maioria inclina-se para reeleger Lula, se nós os formadores de opinião durante mais de um ano temos afirmado e reafirmado, ou melhor, temos sentenciado, a cada minuto de todas as horas, a cada hora de todos os dias, em todos os dias da semana, de que Lula não passa de um chefe de uma quadrilha?''.

Diz um: é porque os integrantes das classes ''d'' e ''e'' são analfabetos e não lêem jornais. Errado, retruca um outro: na mais miserável favela há antenas de tv. Um douto analista diz que, pragmático, o povo ''não está nem aí'' para a corrupção.

Em todas as explicações dadas por esses duques e duquesas do jornalismo é nítido o desprezo pelo povo brasileiro. São incapazes de admitir que o povo pela sua própria experiência, pela didática dura e eficiente da vida, elevou sua percepção crítica sobre quem é quem na política brasileira, e, está fazendo suas escolhas.

Essa melancolia do jornalismo togado que se julgava dono da consciência do povo é uma boa nova. ''Os de baixo'' se movimentam na direção oposta ao que lhes ordena a mídia ''dos de cima''.

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