José Paulo Kupfer
Aconteça o que acontecer na economia, a culpa é sempre dos gastos públicos. Essa bem poderia ser a lei econômica geral do neoliberal de plantão. Anda meio fora de uso mundo afora. Nem mesmo o FMI fica mais martelando na tecla. Mas, aqui em Pindorama, tal é a pressão que até unha encravada é culpa do gasto público... perdão, da “gastança”.
As taxas de juros continuam nas nuvens? Ora, só vão baixar quando os gastos públicos forem controlados. O real está excessivamente valorizado? Também, com essa baixa qualidade do gasto público. O Brasil não vai deixar a rabeira do crescimento entre os emergentes? Amigo, com esse descontrole do gasto público, nem pensar.
É preciso, claro, controlar os gastos públicos. Gastar direito e na hora certa. Mas, vem cá, de que gastos públicos estão falando? Das despesas com juros da dívida pública, aquela enorme sangria de R$ 180 bilhões por ano, quase 10% do PIB e mais de quatro vezes o “insuportável” déficit do INSS? Não, óbvio que não.
O que incomoda a essa gente bronzeada, com renda para viver sem se misturar num país escandalosamente excludente e privatizado, é o gasto corrente, aquele que paga o salário dos servidores, as aposentadorias e as pensões. Atacam todo o tempo, inventando teorias retorcidas sobre os males dos aumentos reais do salário mínimo. E qualquer política compensatória de rendas vem sempre colada com a (des)qualificaçã o de “assistencialista” .
Dê uma olhadinha em volta e observe, por favor, se há, entre eles, alguém que dependa do Estado para o que for. Já resolveram tudo no mundo privado. Seus filhos estão em escolas particulares e seus casos de saúde são tratados em hospitais-hoté is, garantidos por planos de saúde privados (O sistema público de saúde só é lembrado quando a doença exige tratamento caro e sofisticado, normalmente oferecido por centros públicos de excelência, mas isso deixa pra lá.) O fim de semana é dentro de shoppings climatizados e suas casas, de muros altos, grades e porteiros eletrônicos em série, são protegidas por empresas particulares de segurança.
Em resumo, quem ataca incondicionalmente o gasto público não precisa do Estado. Mas a imensa maioria, num país que é um vergonhoso caso mundialmente conhecido de má distribuição de renda, precisa – e muito. Sendo que esses que precisam pagam bem caro pelos serviços em geral de má qualidade que recebem. Os neoliberais gostam de dizer que não há almoço grátis. Parece não fazer sentido – e não faz mesmo –, mas, paradoxalmente, essa é uma verdade para o andar de baixo, e nem tanto para as elites.
Não é por coincidência que esses mesmos privatizados, obsessivos declamadores da oração dos cortes nos gastos públicos e defensores da privatização de serviços essenciais – mesmo daqueles em que é óbvia a incapacidade do mercado em garantir, apenas por conta própria, acesso universal a eles –, costumam fazer uma grande confusão com o tema da carga tributária.
O mantra é cortar gastos e encolher o Estado para reduzir a carga tributária. Reduzir a carga de quem, cara pálida? Eis aí uma questão que nunca aparece, mas deveria aparecer, antes de qualquer outra. Afinal, se a carga tributária média é realmente muito elevada para os padrões médios de renda dos brasileiros, o pior dela não é isso: é a sua extrema desigualdade. Reduzir a carga simplesmente fazendo cortes lineares de impostos e contribuições é bom para os ricos, mas nem tanto para os pobres.
Desses que se descabelam com a carga tributária, nenhum se lembra de quanto esse carga é injusta e distorcida. Mas o fato é que, no Brasil, a carga tributária dos mais ricos é praticamente a metade da carga tributária dos mais pobres. O paradoxo foi recentemente confirmado por um estudo fresquinho e insuspeito do Instituto de Pesquisas Econômicas da USP (Fipe-USP), elaborado em 2006 para a Federação do Comércio de São Paulo.
Na média, como todos sabemos, a carga tributária alcança quase 40% do PIB. É um nível mais alto do que a vigente em muitos países ricos e pelo menos 40% maior do que o praticado em outros emergentes. Mas a média não revela o real problema: a péssima estrutura do sistema tributário brasileiro e sua escandalosa iniqüidade.
É um sistema em que os impostos indiretos ganham longe dos diretos e no qual as contribuições sobre faturamento já respondem por cerca de um quarto do total arrecadado. O resultado é que empresas, que deveriam ser aliviadas, pois garantem empregos, são sufocadas e as cadeias produtivas, taxadas em razão do seu ciclo natural de produção (cadeias mais longas pagam mais) e não por critérios definidos pela política econômica.
Além disso, pessoas com renda de até dois salários mínimos empenham o equivalente a 48% de sua renda com impostos, taxas e contribuições. Já os que ganham mais de 30 mínimos, são taxados em 26% de seus rendimentos. Esses são extremos de uma curva consistente em que quanto mais rico o cidadão, menos ele deixa para os cofres públicos – e vice-versa.
É mesmo o fim do mundo. Mas quem aí já viu os descabelados do ajuste fiscal preocupados com isso?
Fonte: NoMínimo/IG
As taxas de juros continuam nas nuvens? Ora, só vão baixar quando os gastos públicos forem controlados. O real está excessivamente valorizado? Também, com essa baixa qualidade do gasto público. O Brasil não vai deixar a rabeira do crescimento entre os emergentes? Amigo, com esse descontrole do gasto público, nem pensar.
É preciso, claro, controlar os gastos públicos. Gastar direito e na hora certa. Mas, vem cá, de que gastos públicos estão falando? Das despesas com juros da dívida pública, aquela enorme sangria de R$ 180 bilhões por ano, quase 10% do PIB e mais de quatro vezes o “insuportável” déficit do INSS? Não, óbvio que não.
O que incomoda a essa gente bronzeada, com renda para viver sem se misturar num país escandalosamente excludente e privatizado, é o gasto corrente, aquele que paga o salário dos servidores, as aposentadorias e as pensões. Atacam todo o tempo, inventando teorias retorcidas sobre os males dos aumentos reais do salário mínimo. E qualquer política compensatória de rendas vem sempre colada com a (des)qualificaçã o de “assistencialista” .
Dê uma olhadinha em volta e observe, por favor, se há, entre eles, alguém que dependa do Estado para o que for. Já resolveram tudo no mundo privado. Seus filhos estão em escolas particulares e seus casos de saúde são tratados em hospitais-hoté is, garantidos por planos de saúde privados (O sistema público de saúde só é lembrado quando a doença exige tratamento caro e sofisticado, normalmente oferecido por centros públicos de excelência, mas isso deixa pra lá.) O fim de semana é dentro de shoppings climatizados e suas casas, de muros altos, grades e porteiros eletrônicos em série, são protegidas por empresas particulares de segurança.
Em resumo, quem ataca incondicionalmente o gasto público não precisa do Estado. Mas a imensa maioria, num país que é um vergonhoso caso mundialmente conhecido de má distribuição de renda, precisa – e muito. Sendo que esses que precisam pagam bem caro pelos serviços em geral de má qualidade que recebem. Os neoliberais gostam de dizer que não há almoço grátis. Parece não fazer sentido – e não faz mesmo –, mas, paradoxalmente, essa é uma verdade para o andar de baixo, e nem tanto para as elites.
Não é por coincidência que esses mesmos privatizados, obsessivos declamadores da oração dos cortes nos gastos públicos e defensores da privatização de serviços essenciais – mesmo daqueles em que é óbvia a incapacidade do mercado em garantir, apenas por conta própria, acesso universal a eles –, costumam fazer uma grande confusão com o tema da carga tributária.
O mantra é cortar gastos e encolher o Estado para reduzir a carga tributária. Reduzir a carga de quem, cara pálida? Eis aí uma questão que nunca aparece, mas deveria aparecer, antes de qualquer outra. Afinal, se a carga tributária média é realmente muito elevada para os padrões médios de renda dos brasileiros, o pior dela não é isso: é a sua extrema desigualdade. Reduzir a carga simplesmente fazendo cortes lineares de impostos e contribuições é bom para os ricos, mas nem tanto para os pobres.
Desses que se descabelam com a carga tributária, nenhum se lembra de quanto esse carga é injusta e distorcida. Mas o fato é que, no Brasil, a carga tributária dos mais ricos é praticamente a metade da carga tributária dos mais pobres. O paradoxo foi recentemente confirmado por um estudo fresquinho e insuspeito do Instituto de Pesquisas Econômicas da USP (Fipe-USP), elaborado em 2006 para a Federação do Comércio de São Paulo.
Na média, como todos sabemos, a carga tributária alcança quase 40% do PIB. É um nível mais alto do que a vigente em muitos países ricos e pelo menos 40% maior do que o praticado em outros emergentes. Mas a média não revela o real problema: a péssima estrutura do sistema tributário brasileiro e sua escandalosa iniqüidade.
É um sistema em que os impostos indiretos ganham longe dos diretos e no qual as contribuições sobre faturamento já respondem por cerca de um quarto do total arrecadado. O resultado é que empresas, que deveriam ser aliviadas, pois garantem empregos, são sufocadas e as cadeias produtivas, taxadas em razão do seu ciclo natural de produção (cadeias mais longas pagam mais) e não por critérios definidos pela política econômica.
Além disso, pessoas com renda de até dois salários mínimos empenham o equivalente a 48% de sua renda com impostos, taxas e contribuições. Já os que ganham mais de 30 mínimos, são taxados em 26% de seus rendimentos. Esses são extremos de uma curva consistente em que quanto mais rico o cidadão, menos ele deixa para os cofres públicos – e vice-versa.
É mesmo o fim do mundo. Mas quem aí já viu os descabelados do ajuste fiscal preocupados com isso?
Fonte: NoMínimo/IG
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