26 outubro 2006

Fui convencido por alguém que sempre tentei convencer



Por Mário Milani



Avenida sete de setembro, centro de Curitiba.

Estaciono o carro cheio de adesivos. No vidro traseiro, meus candidatos preferenciais. Militante político de classe média desde os tempos da ditadura brava, com intensa atuação nos movimentos sociais, nunca deixei de me posicionar. Pautado no sonho de um Brasil diferente na sua diversidade, porém igual no seu estômago, nossa maior dificuldade sempre foi à tarefa de trazer para o nosso lado os mais humildes. Foi assim em todas as campanhas presidenciais, desde a primeira, em 1989. Os resultados adversos traziam dúvidas quanto a nossa capacidade de atrair as camadas mais populares.

Agora numa cena atípica, inusitada, travo um diálogo com um senhor de aparência simples, cidadão franzino, 56 anos mais ou menos, morador da periferia. De estatura mediana e olhos castanhos acesos, o guardador de carros José Agripino Cerqueira, ganha a vida no centro da cidade vendendo cartões de estacionamento público. Com passos firmes e largo sorriso no rosto vem ao meu encontro:

- Eu também vou votar no "home” – disse-me ele olhando para o adesivo grudado no pára-choque.

- Eu não. Respondi, justificando: o veículo é da minha filha. Ela vota no homem, mas eu não ainda não me decidi. Não estou certo de quem é o melhor para governar o Brasil nos próximos quatro anos.

Fiz-me de desentendido para saber os reais motivos para tanta convicção. Pensei, vou fazer como nos velhos tempos quando faltavam recursos para contratar institutos. As pesquisas eram feitas através das conversas com pessoas do povo.

- Quero que o senhor me dê motivos para votar no seu candidato!

Ele prestativo respondeu:

- Meu amigo, são muitos e bons motivos. Não só eu vou votar nele, mas toda minha família e todos os meus amigos do bairro. O senhor sabe quanta custa o preço do arroz, do feijão, da farinha?

- Não. Respondi fazendo-me de desinformado.

- Ontem fui ao mercado fazer as compras do mês. Paguei por cinco quilos de arroz R$ 4,59 reais. Quanto custava no tempo “deles”, no tempo do FHC? R$ 12 reais. No empório da minha Vila chegou a custar até R$ 15 um pacote de arroz quebrado, de terceira. E a carne, quando a gente comia, e quanto se pagava? R$ 12 até R$ 18 reais. A gente passava dias sem comer um pedaço de carne. E agora, um quilo de carne boa compra-se por R$ 7 reais. Já paguei R$ 6,80 por um quilo de alcatra. E a farinha de trigo? Comprei cinco quilos por R$ 3,99.

- Mas os economistas, e o outro candidato, falam que o Brasil não cresceu como deveria! – provoquei.

- Para nós, nunca cresceu tanto, melhorou muito, mudou nossa vida. Agora estamos comendo arroz, feijão e carne todo dia. Isso que é crescimento, mudança. Todo mundo lá no bairro reformou sua casa.

- Como assim?

- Quanto o senhor pagava pelo cimento na época deles? 22, 23, 24 até R$ 28 reais o saco de 60 quilos. Quanto que custa hoje?

- Sinceramente, não sei! – afirmei instigando.

- R$ 13 reais a saca. Todos os materiais de construção estão mais baratos. É só conferir nas lojas.

- E essa história de corrupção, dossiê...

- Isso é bobagem, dinheiro de pinga. Quando você entra numa disputa não joga sozinho, tem o adversário, tem o outro time. Assim é na política, eles vão arrumar todas as tramas para derrubar o Presidente do povo. Sobre o dossiê a gente brinca lá no bairro: -E esse tar de doce-ie é de comê ou é de bebê? – disse rindo indagando.

- O senhor ouviu falar no programa do governo chamado PROUNI? O filho do pobre agora pode sonhar em ir para a faculdade porque tem a garantia de uma bolsa paga pelo governo – explicou com orgulho.

- Pela primeira vez em 10 anos de casado levei minha patroa jantar numa churrascaria, num rodízio de carnes, um desejo antigo dela. Quando isso aconteceu pra nós da classe pobre? Nunca! – desafiou e completou:

- Eles sempre falavam que o culpado de tudo era a inflação. Pela primeira vez nos últimos anos ela está controlada e o salário teve um bom aumento. Quanto era, quanto é? – perguntou, puxando pela memória: - Lembra do chuchu? Era o grande causador da inflação. Hoje posso comprar minhas coisinhas em prestações baixas e iguais. – finalizou enquanto tirava do bolso um bilhete escrito à mão:

“Não vote no “xuxu”. Vote no Lula. Vote 13. Obrigado”.


Mário Milani é jornalista.

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