29 setembro 2006

Combate implacável


Jeferson Miola, integrante do IDEA

A paisagem político-eleitoral pré-dossiê estava assim:

[1] a reeleição de Lula no primeiro turno mais consolidada do que nunca;

[2] estimativas de manutenção e mesmo crescimento da representação do PT no próximo Congresso Nacional;

[3] fotografias, vídeos e indícios do envolvimento de Serra, do PSDB e de deputados Sanguessugas com a família Vedoin já eram investigadas pela Polícia Federal e circulavam amplamente pela internet;

[4] o barco de Alckmin fazendo água e sendo abandonado por governadores do próprio partido;

[5] os mais desesperados do PSDB e do PFL promovendo ataques a Lula e bradando teses golpistas;

[6] o PSDB, o PFL e seus satélites PV e PPS abafando a investigação sobre a relação de Serra e do governo FHC com a família Vedoin;

[7] a Polícia Federal executando com profissionalismo e independência seu dever republicano, independentemente de quem pudesse ser descoberto e punido e em relação a qualquer tipo de crime;

[8] a palavra-de-ordem do comando da campanha de Lula nos quinze dias finais de campanha deveria ser "administrar a vitória com sensatez e serenidade! ".

Diante dessa paisagem pré-dossiê, a dedução óbvia é de que não interessaria a Lula, ao PT e ao governo essa estupidez que, ao que tudo indica, parece ter sido cometida por alguma espécie de

"Divisão Brancaleone", com presumido domicílio e coordenação em São Paulo e algumas sucursais espalhadas pelo país.

Mesmo com a evidência oceânica de que jamais poderia interessar ao projeto reeleitoral de Lula e ao PT comprar dossiê, a repercussão dada ao caso pela imprensa nacional, contudo, é assustadora. Não há, rigorosamente, uma cobertura honesta e menos ainda séria de parte dos monopólios conservadores da mídia nacional. Em todos esses dias, não foi feita nenhuma reportagem problematizando o assunto desde o ponto de vista fundamental de que nada do que está ocorrendo interessa ao Lula, ao PT e ao projeto re-eleitoral.

É natural e desejável que o assunto tenha repercussão importante em toda a imprensa. O inaceitável, porém, é a absoluta parcialidade dos principais veículos de comunicação do país na cobertura do tema. Em linguagem futebolística, poder-se-ia dizer que a imprensa conservadora vem tendo uma atuação luxuosa no seu escopo de construir uma versão única, pasteurizada e de acusação ao PT e a Lula.

São enxurradas de editoriais e notícias, manchetes dos jornais, páginas e mais páginas inteiras enfocando o assunto desde uma ótica unilateral; matérias com suposto conteúdo analítico traçando analogias entre o caso presente e "Watergate" e Getúlio em 1954; e inclusive reportagens ilustradas para revestir o assunto de um viés investigatório e sensacionalista.

Ou seja, é usada toda a sorte de artifícios, truques e recursos de linguagem para acessar amplas camadas sociais e operar nos vários planos do raciocínio e da consciência das pessoas. Mas sobre o conteúdo propriamente do dossiê, que é a possibilidade de envolvimento do governo FHC com a máfia das sanguessugas, a imprensa se cala e se omite.

O enorme apoio popular a Lula nas eleições está associado aos benefícios sociais e materiais obtidos pelo povo brasileiro durante o atual governo. E é por isso que sua candidatura fica imunizada dos ataques odiosos, preconceituosos e falso-moralistas desferidos tanto pela oposição conservadora quanto pela mída inconfiável [a respeito desse último aspecto, vale ler o excelente artigo "O Povo não acredita na imprensa", de Emir Sader, publicado na Agência Carta Maior de 17/09/06].

Se a direita tem consciência desse comportamento sócio-eleitoral do povo brasileiro e de que o clima de denuncismo e golpismo dificilmente poderia abalar o favoritismo de Lula, qual seria, então, a razão fundamental para os movimentos articulados em torno do episódio, para além da busca de dividendos eleitorais imediatos?

Uma resposta poderia estar relacionada à tentativa de deslegitimação do segundo governo Lula antes mesmo de confirmada sua eleição. A idéia essencial da direita é de que é necessário combater o novo governo implacavelmente, antes da posse e durante cada segundo do exercício do mandato, para assim viabilizar uma alternativa conservadora para a reconquista do poder de Estado em 2010.

Dois personagens fornecem a senha para vislumbrarmos esse lugar futuro que, de fato, já começou. O Senador Heráclito Fortes [PLF/PI] anunciou a criação de uma CPI para funcionar "depois das eleições"; e o presidente do TSE, Marco Aurélio Mello, diz que as investigações do Tribunal levarão meses, mas que ainda assim poderão causar a cassação do eleito.

Tempos tormentosos nos aguardam. A direita já monta a arena de batalha e prepara o arsenal para o combate ainda mais duro e implacável contra Lula, o governo, o PT e a esquerda brasileira. E a mídia conservadora escolheu o lado na batalha.

Jeferson Miola integra o IDEA - Instituto de debates, estudos e alternativas de Porto Alegre

Nenhum comentário: