15 setembro 2006

O LIMITE DA IRRESPONSABILIDADE


O limite da irresponsabilidade é sempre o suicídio, ainda que haja exemplos de suicídios cometidos exatamente por alto senso de responsabilidade.

O de Getúlio Vargas, mesmo para os anti-getulistas, é um exemplo. Getúlio sobrepôs a responsabilidade aos seus ideais, concorde-se com eles ou não, à própria vida.

A morte de Getúlio e a continuidade do getulismo serviu de exemplo para algum "iluminado" que alertou à oposição sobre o tamanho da besteira que estavam promovendo, conforme deixa entrevisto num editorial da Folha de São Paulo o Otávio Frias Filho.

Provavelmente reproduzindo as palavras deste anônimo "iluminado" oposicionista, Frias reconhece que o impeachment seria fazer de Lula um herói.

Não é revelado o nome da inusitada inteligência que conteve a sandice do Reale, da OAB, do FHC e do próprio Frias, mas se presume ser alguém com suficiente clarividência para lembrar seus companheiros de que a legenda que antes os congregava, a UDN, teve de carregar o peso de um herói morto por 10 anos, até obter a aliança de alguns altos escalões das Forças Armadas e o apoio do governo norte-americano, assombrado pelos fantasmas da Guerra Fria e o vexame da Baía dos Porcos.

Uma conjunção de fatores que FHC tentou recriar, ao perceber que errara a mão em sua primeira aposta. Do alto de seus preconceitos acadêmicos, o professor acreditou que o governo do operário sem diploma seria um fracasso maior do que o seu próprio. Perdendo a rodada, quis reeditar 64 buscando um Lincoln Gordon, o embaixador norte-americano que intermediou junto ao governo de Kennedy o apoio aos golpistas que instauraram a ditadura militar.

Conforme noticiado em um número do Financial Times do início de 2005, FHC foi encontrar esse intermediário numa ex-secretária de Bill Clynton para assuntos latino-americanos, com a qual montou um escritório em New York para alertar o Presidente Bush sobre os perigos de esquerdização do continente.

A Guerra Fria de FHC talvez até tivesse dado certo, se o governo Lula fosse de fato uma mera continuidade do seu, como pretendiam alguns sem capacidade para desenvolver melhor argumento crítico.

Se faltou o argumento, a capacidade crítica também não se fez presente e lhes foi impossível perceber que o Brasil não mudara apenas nos números da gritante evolução econômica. Enquanto incitavam seus correligionários a distribuírem piadinhas pela internet e pela mídia sobre as viagens de Lula, nessas viagens Lula surpreendia o mundo com propostas que passaram a pautar as reuniões das cúpulas do poder mundial.

Enquanto aliciavam suspeitos jornalistas de pouca credibilidade para publicar notas difamatórias sobre os hábitos do presidente da República das Bananas, esse mesmo presidente demonstrava internacionalmente que seu carisma não provinha de momices ou subserviências, mas de resultados efetivos que confirmavam o país ser bem mais do que mero produtor de bananas.

Enquanto ironizavam a falta do dedo de uma das mãos, para demonstrar a incapacidade dos trabalhadores, Lula demonstrava que se não é com diplomas, muito menos é com o mindinho que se conquista credibilidade em política e economia internacional.

O Brasil passa a ser convidado às reuniões das nações desenvolvidas, paga as dívidas que o tornavam dependente da estabilidade econômica de outros países, comanda as tropas de paz da ONU no Haiti e vira moda no primeiro mundo.

Internacionalmente, a Guerra Fria de Fernando Henrique só congelou o próprio Fernando Henrique.

Mas o professor mandou esquecer tudo o que escreveu antes e pôs o seu projeto político à frente da ciência que ministrou nas academias, e da responsabilidade com a nação que deveria permanecer em todo aquele que já a presidiu.

Pouco se importando com o impacto social que poderia causar um novo descrédito da população, inflamou uma ferida encontrada no corpo do partido governista tentando provocar uma eclampsia. Para isso teve de insuflar o veneno da mídia, armando o maior cerco já montado contra um governo no país.

Como matilha, seus correligionários cercaram a caça através de 3 das mais longas e divulgadas CPIs já ocorridas na história parlamentar. Tanto vociferaram e ladraram, tantos estraçalharam, que acabaram mordendo o próprio rabo, expondo-se como precursores dos crimes que acusavam.

E as CPIs findaram sem qualquer outro resultado, além de obter o afastamento daqueles que consertaram os erros praticados por quem os condenou, enquanto comandados por Fernando Henrique como presidente do Brasil.

Mas essa já foi uma grande vitória, muito comemorada pela tropa de FHC nos salões e corredores do congresso. Agora era só esperar o operário quebrar-se sozinho, na solidão em que o bloquearam.

No entanto, os números, os fatos, mostraram uma realidade diferente do tão desejado fracasso. O país não só resistia, como progredia num ritmo jamais ocorrido há décadas, contrapondo-se em 3 anos à letargia dos 8 anos de governo FHC.

E aí, a nítida instabilidade psíquica de FHC, a megalomania, contagiou muitos de seus correligionários, levando-os coletivamente aos limites mais perigosos da irresponsabilidade: o pedido de impeachment.

Felizmente para todos os brasileiros, o incógnito iluminado noticiado pelo Otávio Frias, chamou-os à razão.

Provavelmente, alguém entre eles, talvez o próprio Frias, ou quem sabe FHC mesmo, tenha menosprezado o alerta a princípio, citando o exemplo de Collor de Melo, obrigando aquele raro pensante a discorrer sobre as enormes distâncias entre os dois casos.

Pacientemente terá explicado que Lula não foi um produto de marketing criado por aquela mesma mídia que repercute casuísmos, utilizando para derrubá-lo as mesmas manipulações que utilizou para eleger Collor.

Possivelmente haverá lembrado que Collor, ao assumir, confiscou o dinheiro do povo, e Lula, muito pelo contrário, promove a distribuição de renda reduzindo a pobreza.

A denúncia pronunciada contra Collor, além de atingí-lo direta e pessoalmente, partira de seu próprio irmão, enquanto a que depôs contra o partido de Lula surgiu de um réu confesso, vingando-se pelas investigações do governo o terem comprovado como corrupto.

As tantas denúncias contra o partido, amigos e ministros de Lula, ou não foram comprovadas, ou já se comprovaram improcedentes. E mesmo os erros efetivamente cometidos, não o foram em benefício próprio dos que os praticaram. O único caso assim confirmado: o do carro de Sílvio Pereira, é sabidamente ridículo se comparado as tantas suspeitas em que estão envolvidos os que se beneficiariam com um impeachment do atual governo.

E, acima de tudo: como aplicar impeachment num presidente que mesmo durante os piores momentos da crise, foi avaliado positivamente pela maioria da população.

Salvo em exemplos como o de Getúlio Vargas, o limite da irresponsabilidade é o suicídio. Mas antes de alcançar esse limite, o irresponsável é capaz de prejudicar muita gente. Nesse caso, uma nação inteira.

Tão absurdo quanto soltar das cadeias todos os membros das facções criminosas, é o fato de não existir "iluminados" na imprensa brasileira, ou nos partidos da oposição, que se perguntem quais seriam as conseqüências desse impeachment que a todo momento algum maluco propõe nestas vésperas de eleições, onde o presidente é apontado como preferido por quase 60% da população.

Que não sejam patriotas, mas que ao menos possam avaliar as irreversíveis conseqüências internacionais? Quando o Brasil voltaria a ser encarado como país sério, democrático, confiável?

Qual grupo empreendedor se arriscaria a investir aqui nas próximas décadas?

Como o Banco Mundial e tantas outras instituições que apontam o governo Lula como exemplo para o mundo e esperança para a América Latina como liderança continental, se relacionaria com o sucessor de um eventual impeachment de Lula, fosse quem fosse?

FHC? Claro que sua comprovada subserviência muito agradaria à Bush, mas sabe-se que Bush não elegerá seu próprio sucessor e internacionalmente é o mais mal visto de todos os governos da história dos Estados Unidos.

Seríamos, como país, o grande bobo da corte mundial.

Alckmin? É possível imaginar Alckmin discutindo sobre exportação de picolé de chuchu para o mercado externo?

Quem? O que esperam para o país, esses irresponsáveis que repetem a irresponsável tese FHCiana do impeachment? Até explicável em FHC, atingido em sua popularmente conhecida megalomania, mas quem são estes demais insanos?

Que perigo para todos nós, cidadãos, uma elite composta por tantos inconseqüentes a insistir neste evidente desastre!

Se não há uma camisa de força a ser colocada nessa gente, se não temos sequer essa firmeza institucional, isso não é um país. É um hospício e estamos todos em sério risco, pois os loucos parecem firmes no propósito de nos levar a todos em sua insanidade suicida.

Raul Longo

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