14 setembro 2006

"Reeleição de Lula não é chavismo", diz Coimbra, do Vox Populi




A nítida preferência dos eleitores mais pobres e de menor instrução está garantindo a reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas o fenômeno não deve ser entendido como um "chavismo à brasileira", segundo o diretor do Vox Populi, Marcos Coimbra.

"Lula está ganhando a eleição porque conseguiu comparar favoravelmente seu governo com o anterior, não porque teria dividido o país entre pobres e ricos", afirmou Coimbra à Reuters na quinta-feira. Nestas eleições, o Vox Populi foi contratado para dirigir as pesquisas na campanha do presidente-candidato.

Para o cientista político, a oposição aceitou o jogo de Lula, tratou a questão ética de maneira "histérica", anestesiando o eleitorado em relação a escândalos e, por isso, a menos de 20 dias da eleição, o quadro já estaria consolidado.

"Os candidatos, os bancos, todos os que recebem pesquisas não têm mais dúvidas quanto a isso", disse. "É uma conformação nova e é difícil imaginar o que vai acontecer, mas podemos evitar certos equívocos de avaliação."

O principal desses "equívocos", segundo Coimbra, seria tomar a virtual reeleição de Lula como um sintoma de que o Brasil estaria politicamente dividido entre pobres, que votam no presidente-candidato, e ricos, que preferem o candidato do PSDB, Geraldo Alckmin.

"Estamos encarando nessa eleição o velho mito de que o povo não sabe votar", disse o analista à Reuters. "A prevalência desse entendimento em determinados círculos pode nos levar a algo muito negativo e prejudicial ao debate, como por exemplo a falsa idéia de um chavismo à brasileira."

RICOS X POBRES

Na pesquisa Datafolha divulgada terça-feira, o tucano alcançou 52 por cento das intenções de voto entre eleitores com renda familiar acima de dez salários mínimos, contra 25 por cento de Lula, quando havia um empate técnico neste segmento uma semana antes. Entre os que ganham até um salário mínimo, Lula bate Alckmin por 59 a 21 porcento

Para alguns analistas, isso caracterizaria uma divisão semelhante à que ocorre na vizinha Venezuela sob Hugo Chávez, mas as últimas pesquisas do Vox Populi e do Ibope mostram empate técnico de Lula e Alckmin entre os ricos.

"A base da amostra nas faixas mais altas de renda e escolaridade não permite configurar uma tendência nova, mas a principal característica dessa eleição é a distância entre ricos e pobres", disse Mauro Paulino, diretor do Datafolha.

"A série mais longa das pesquisas mostra intenções de voto semelhantes para Lula e Alckmin nessas faixas, apesar de variações de amostra", discorda Coimbra. "Se os ricos e instruídos fossem mesmo contra Lula, uma boa parte desses eleitores seria menos inteligente que a outra."

Para Paulino, do Datafolha, o impacto de programas assistenciais, especialmente o Bolsa Família, determina a vantagem do presidente-candidato.

"Lula não vai ganhar a eleição porque comprou voto com programa assistencialista", discorda Coimbra mais uma vez. Ele recorda que entre 2001 e 2002, o governo Fernando Henrique Cardoso ampliou "a toque de caixa" seus programas sociais e isso "não ajudou em nada" o candidato oficial na época, José Serra.

"Rigorosamente, o Bolsa Família simboliza apenas o compromisso cumprido por Lula, juntamente com a política salarial e a política de preços menores na cesta básica", afirmou Coimbra. "Lula disse que era diferente dos outros, que faria mais que os outros, e uma impressionante maioria está concordando com isso."

VIRANDO O JOGO

Marcos Coimbra ressalta que no espaço de um ano, desde o escândalo do mensalão, Lula reverteu um quadro em que era rejeitado por quase metade da população, seu índice de votos tinha regredido ao patamar histórico de 30 por cento e ele deveria perder no segundo turno para qualquer adversário,.

"Lula decidiu transformar uma eleição perdida numa comparação entre o seu governo e o do Fernando Henrique", analisa Coimbra. "Foi como se o técnico do Brasil tivesse combinado a estratégia com a seleção adversária, porque a oposição bateu em retirada, nenhum programa de TV defendeu FH."

Para o analista da candidatura oficial, o eleitor mais simples não tomou os escândalos como critério exclusivo para decidir seu voto, por que "personagens vociferantes na televisão criaram uma histeria que acabou anestesiando o eleitor em relação a esse tema, o que não significa conivência."

"Seria até paradoxal que justamente o eleitor mais instruído fosse decidir seu voto levando em conta um único fator, a corrupção, e o eleitor mais simples decidisse de forma mais sofisticada", compara Coimbra. "Isso não é verdade, embora muitas vozes queiram afirmar que seja."

Fonte: Agência Reuters

Nenhum comentário: